terça-feira, 31 de janeiro de 2012

11. No love, no glory...

E pela terceira vez... quando tudo parece encaminhado... quando tudo parece menos complicado...
...mais uma rasteira, mais uma queda. E vamos todos ao chão.
De cada vez que isto acontece penso "não volto a dizer nada!" "não volto a dizer que ele está melhor!"... para depois não piorar no dia seguinte...

É como levar um murro. É como ver um vinte na pauta e depois veres que não é teu. É... voltarem a tirar-te o ar. Este é o pensamento instantâneo. O seguinte... é sempre "amanhã já vai estar melhor", "amanhã é que é...".

Nestes três meses tenho aprendido muita coisa:
a) Ninguém está preparado.
b) A vida não é justa.
c) Não tem que ser justa.
d) A culpa não é minha.
e) Nem de ninguém.
f) Não desisto.
g) As capacidades humanas vão muito além do esperado.
h) Milagres existem. Todos os dias.

Sei que hás de vir para casa. Só não sei quando.

E penso "o que foi que eu ainda não aprendi?", "com que erros ainda não aprendi?", "o que tenho de mudar em mim?".
Três vezes. Chega. 

domingo, 29 de janeiro de 2012

10. Se soubesse que me olhavas...

"Não, mãe." "Está aqui mãe.". "Olá mãe!"
. As enfermeiras têm muito esse hábito. Parece que as educadoras também tratam assim as mães dos bebés. Acho que não gosto.
A primeira vez que ouvi isto acho que nem liguei... Demorei uns segundos até perceber que estavam a falar comigo. Depois comecei a habituar-me, aos poucos.
Quando vamos fora de horas, temos de dizer "Somos os pais do Bernardo!" ou "É a mãe do Bernardo!". E ainda não é completamente inato assumir-me com esta nova identidade.
Acho que tenho de treinar ao espelho, ou dizer muitas vezes baixinho para depois acabar por sair com mais naturalidade. "Sou a mãe do Bernardo."
Certamente daqui a alguns anos, quando me ligarem da escola por algum motivo, vou pensar "Bolas Bernardo, o que fizeste desta vez?".
Agora quando me ligam por causa dele, nunca são bons motivos. Prefiro não receber chamadas a perguntar se sou a mãe do B.

Ando cansada. Cansada desta rotina diária. Cansada de ter que ter sempre tanta paciência. Cansada de dormir aos bocadinhos e sempre tão mal. Se ele cá estivesse seria muito pior, tenho a certeza... mas, pelo menos, ele estaria cá.

Já faltou mais, mas ainda falta tanto.
Gerir expectativas. Antecipar o que ainda vai acontecer. O que pode correr bem, o que pode correr mal. Preparar cenários diversos. Estou cansada.
Acho que também estou um bocadinho chateada. Deve fazer parte. Como diz o Palma, "sobrevivendo ao comprimido e à bebedeira"...

Entretanto...
... "sou a mãe do Bernardo!"

domingo, 22 de janeiro de 2012

9. That's how I feel whenever you ain't there It's no air, no air

Às vezes tenho vontade de pegar em ti e levar-te dali para fora.
Trazer-te comigo para casa. Agarrar-te para sempre. Cheirar-te e abraçar-te.
Ontem, (ou já seria hoje?) estavas tão lindo, a olhar para nós... Não queria vir-me embora.
Os teus olhos, ainda de cor indefinida, olhavam para todo o lado. Para cima, para baixo, para mim e para o pai. O que será que conseguias ver? Parecias admirado.
O mundo é tão grande e com tanto para ver, ouvir e cheirar...

Vamos embora, miúdo!!!



sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

8. Let it be

"Vão ter que sair agora."  é uma frase que ouvimos com alguma frequência.
E sempre que a oiço, sinto-me que o sangue começa a ferver cá dentro. E quando consigo esconder aquilo que sinto, e evitar responder mal, há alguém que ocupa o meu lugar com o mau feitio...

"..mas porquê?" oiço perguntar. E assisto a um debate de ideias entre nós e as auxiliares, enfermeiras e médicas.   Penso que nenhuma delas (com quem já discutimos) tem a noção do que é ter alguém doente. Faz impressão? Faz impressão para quem? O que é que faz impressão? Ver alguém tão doente que nem reage quando lhe apertas a mão? Alguém que à nossa frente, baixa tanto a frequência cardíaca que tem que levar manobras de reanimação? Isso é que faz impressão... não é picar um pé, uma mão ou um braço.
"não é suposto" insistiu uma médica de nariz arrebitado, com ar muito confiante, quando lhe estava a fazer uma gasimetria.
Não é suposto é tudo o que aconteceu. Isso é que não era suposto.
Eu deveria poder a assistir, se quisesse, a tudo o que fazem com o meu bebé. Se me fizer impressão, não assisto. Não é justo serem duas ou três enfermeiras a decidir onde é que nós devemos estar...

Sim, é o meu mau feitio a falar.

"And when the night is cloudy there is still a light that shines on me
Shine until tomorrow, let it be"

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

7. Under pressure...

Existem dois tipos de pessoas... (existem muitos mais, mas...)
Existem vários tipos de pessoas que nos falam sobre o B!

O tipo que nos trata como se não existissemos: "Oi.Como é que ele está?" ou "Já tenho saudades do B" e ainda nem o conhecem. Têm tanta ânsia em saber notícias dele que se atropelam, nos atropelam, e vão logo diretos ao assunto. Este tipo de pessoas é típico e comum a todos os novos pais, que que sentem completamente em segundo plano. Agora é como se existissem apenas os bebés!

O tipo que parecem ter mais esperança que nós próprios... "Eu sei que vai correr tudo bem!" ou "O meu anjo da guarda a mim nunca me falha e eu tenho rezado por ele".
Quando nos dizem coisas destas fico sempre a pensar que raio de imagem é que nós transmitimos...? Será que damos a impressão que não nos importamos? Ou que perdemos a esperança? Fico sempre intrigada com este tipo de pessoas. Perguntam por ele, e quando dizemos qualquer coisa que se pareça com a realidade fazem logo o favor de nos interromper e nem deixar acabar a frase dizendo "...mas vai correr tudo bem! Isso é que importa!"
Ninguém, quando nos pergunta por ele, tem a noção de que as respostas poderão magoar ou frustrar as suas expectativas e não conseguem lidar muito bem com isso... e "tentam" animar-nos com os seus "esfuziantes" votos de confiança. Bolas, só nós sabemos da realidade dura e crua, e ninguém mais do que nós, espera, deseja e sabe que no fim, tudo vai correr bem. Ninguém.

O tipo "como é que ele está?" é curioso. Obriga-me a ter uma noção dos "relatórios" que vou fazendo. Tenho que lembrar-me quando e qual foi a última informação que dei a essa pessoa, e tentar a partir daí gerir a informação que é fornecida. E depois de fazermos os "relatórios", vêm ainda as questões "mas ainda está nos cuidados intensivos?", "quanto é que pesa?", "está a ser medicado?", "mas foi operado porquê?", "o que é que o médico disse", "levou outra transfusão? mas porquê? análises? quais os valores de hemoglobina?".
Decididamente, estes são do tipo que me faz arrepender de falar tanto, e de dizer a verdade. Se eu mentisse, ou dissesse apenas que "vai andando" poupava-me a questões, irritações e...
Ninguém tem de saber os pormenores. Claro que é bom e normal que se preocupem, mas... com limites. Este tipo causa dor.

O tipo que tem um exemplo para dar. Todos conhecem alguém, um primo, um sobrinho, uma amiga, um vizinho, ou então o exemplo da Mariza, da fadista. "Sabemos que vai correr bem!", "cabia na palma da nossa mão", "agora é exactamente como os outros", "parece que tomou vitaminas e está enorme!". Fico mesmo muito feliz com o sucesso dos outros. A sério que fico. E no futuro, eu também terei um exemplo para dar. Bom, melhor, pior... mas será também um exemplo.
Mas, na verdade, eu não quero saber dos outros para nada. Para nada. Eu estou rodeada de exemplos na maternidade. Bons, e menos bons. E lido bem com isso.
Quando me dizem, sem saberem de nada "ai a minha prima era tão pequenina que a mãozinha dela a apertar a nossa, era mesmo pequenina" ou "era um ratinho, nem chegava a um quilo!"...

 Fico calada, sorrio, faço um ar de compreensão. sei lá. Não sabem. Não me vou por a dizer que o meu pesava menos, ou isto ou aquilo. Não interrompo. Deixo-os falar. Sou vaga...

Sei que todos somos um bocadinho de cada tipo, dependendo das situações.
Sei que ninguém tem a intenção de magoar. Querem apoiar, ajudar, confortar...
Sei que nem sempre tenho paciência ou compreensão para suportar estas coisas.
Sei que, no final, vou rir-me por ter escrito estes disparates... que poderão "ofender" quem se rever nestes tipos.
Sei que, tenho o direito de os escrever.
Sei que só nós sabemos.

domingo, 15 de janeiro de 2012

6. Just take my hand...

Pego na tua pequena mãozinha... e tu apertas-me com força, de volta.

A tua mão já está o dobro do que era quando nasceste. Os quatro dedos juntos já quase fazem meio dedo meu. Estás muito grande!

Será que sabes que sou eu que te aperto??? Será que consegues saber, no meio de tanta gente que tem estado contigo, que existem duas pessoas, que todos os dias, várias vezes por dia, te tocam, te dão a mão? E às vezes, mesmo sem te tocaram, estão do lado de fora, a olhar para ti... a olhar por ti?

As enfermeiras garantem que sim. Elas sabem o que queremos ouvir.
às vezes acho mesmo que sabes que sou eu. Portas-te melhor quando ralho contigo. Deixas de chorar quando te faço festinhas ou te dou a mão. Será do toque? A pele diferente? O cheiro e a voz?

És tão giro que sinto que te partilho um bocadinho com todas as enfermeiras que têm cuidado de ti. Ainda hoje me disseram "o bebé mais pestanudo da maternidade!" Elas simplesmente, derretem-se a olhar para ti, e também te dão a mão, fazem-te festinhas e vão ver-te mesmo quando não são elas que estão contigo.

Os que estão cá de fora, contentam-se com as poucas fotos, e com o que contamos. Estão todos muitos ansiosos por te conhecer. Por saber se é verdade tudo aquilo que dizemos...
Eu também estou ansiosa!

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

5.All I need... is a miracle...

Que prenda de anos? ...que prenda de Natal?...
Tanta coisa para escolher... mas "...All I need is you."

Não consigo esquecer a cara, a expressão, a frase que a auxiliar disse, naquela segunda-feira: "Não podem entrar. Têm de esperar um bocadinho. A enfermeira já vem falar convosco."
Passou-me tudo pela cabeça.
Lembro-me que o meu primeiro instinto foi preocupar-me com o Di. Olhar para a expressão dele e tentar perceber o que estava a pensar. Estava muito sério a olhar para ela, com aquele olhar inquisidor (que só resulta para quem não o conhece!).
Estavamos a lavar as mãos ainda, quando apareceu a enfermeira com expressão apreensiva de quem queria comunicar algo grave mas tentado não preocupar os ouvintes. Não trazia boas notícias mas também achei que não eram assim tão más. Tinhamos que aguardar. E foi o que fizemos.
Foi uma hora e tal, mas pareceram minutos. Se calhar na altura, não foi assim tão rápido.

Alívio.
Fiquei estupidamente aliviada ao terem "potencialmente" percebido o que se passava contigo. Esperemos que tenham acertado!
Nesse dia, percebi que "eles" têm dificuldade em lidar ainda com as pessoas. Entendo. Uns são brutos, outros desajeitados, outros evitam-nos. Outros mentem. Mas principalmente, omitem.
Seleccionam informação e retêm a maior parte dela.
Não concordo e irrita-me esta postura. Parece que temos de estar sempre a mendigar para saber como está o nosso filho.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

4. Breathe...

...to make me breathe!

"Este bebé está muito mal!", foi a primeira frase que ouvimos sobre ti.
No mínimo, desconcertante.
Aprecio, nesta frase, a sinceridade, a frieza.
Detestei o desprezo com que foi dito. A indiferença nas palavras.

Quatro injecções de corticóides para a maturação pulmonar não foram suficientes. Os ventiladores têm sido os teus melhores amigos.
Estiveste, até agora, apenas sete dias a respirar por ti. E às vezes, mal.
Aquilo que os outros fazem sem dar conta, aquilo que parece tão inato como viver, como sentir o sangue a pulsar cá dentro, é afinal tão complicado?
Vejo as tuas pequeninas narinas a abrir e fechar; suspiras e bocejas vezes sem conta, mas ainda não chega!
Vá lá miúdo! Queremos tanto dizer-te o quanto é bom correr e ficar sem fôlego, o quanto é bom gritar até ficar rouco, o quanto é bom encher balões em dias de festa! Cantar, soprar, ler, e beijar...
Um dia vais descobrir isso tudo... mas antes...
Respira, por favor!

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

3.Inspiro o ar com força...

...não vá ele fugir-me.
Fazia muito isto. Devia ser da anemia extrema. Quando vim para casa, também. Era intuitivo; como respirar. Notei que com o passar dos dias, fazia menos e mais espaçado. Agora já não. Mas relembro.

Incrível como moléculas complexas, (na verdade são complexos de várias moléculas com iões que compõem a hemoglobina) têm a capacidade de se ligar a outras moléculas ou iões mais ou menos vitais. O2, CO2 ou CN-, por exemplo. Quando nos faltam essas moléculas, falta-nos o ar.

Lembro-me que passei vários dias a chorar. Já nem me podia aturar a mim própria. Imagino os outros. Evitei por isso mesmo estar com outras pessoas nessa altura.Estive "fora" uns tempos.
Uma salganhada de sentimentos. Injusto? Talvez. Desesperante. Doloroso? Muito.
Lamentei-me o suficiente, tive pena de mim mesma. Tanto, que fiquei exausta. Cansei-me.
Umas certas palavras não me saem da cabeça, de alguém que perdeu um filho à nascença. Contou-me que chorou tanto na altura que hoje em dia quase não chora. Acho que percebo.
Nem sei.

  

2.Hoje o dia está cinzento...

tal como a minha camisola. Mas algo mais está cinzento...

Estou de volta. voltei. voltei mais ou menos. (voltei com letra minúscula!). 
Parece que as pessoas andam tristes, inseguras e nervosas.
 Parece que, de repente não temos bem a certeza do que era certo, do que era seguro. Deve ser da falta do Sol!
Bom, para quem ainda duvida, a Terra gira mesmo à volta do Sol e ainda que seja noite, ou esteja nublado, Ele está sempre lá. 
Para quem não sabe, o Sol tem uns pontos que nos parecem negros. São as manchas solares. O Sol lá vai explodindo e expelindo material, e formando as tais manchas... 
E se o Sol tem manchas... porque não hei de ter também?


Pisei o chão de novo. E sei que nunca mais serei a mesma. O ser humano adapta-se, muda, transforma-se, evolui, morre e nasce de novo. Como pessoa, sei que mudou algo em mim. E sei que não voltarei a ser exactamente a mesma. Sinto-me com "pequenas manchas", na alma, no corpo, na esperança...
E sei que dói de uma forma que não sei nem quero descrever.  



8 de Novembro de 2011

1.Assim como as estrelas não nascem do "nada"...

...mas de matéria pré-existente, também foi assim contigo!
O mundo já existia antes de ti, de mim, dos meus pais e dos pais deles...

A matéria forma-se através de outra já existente, pelo menos na maior parte dos casos.
O nosso Sol não é uma estrela de primeira geração e por isso nasceu da matéria que "restou" da morte de outra anterior a ela...
Eu acredito que parte de ti, é um pouco de mim e do papá...
E que serás alguém marcado por quem são os pais.

Sempre tive a arrogância de achar que era especial. Alguns disseram que chegava a ter complexos de superioridade... Hoje estou mais crescida e ainda não mudei de opinião. Continuo a ser petulante e acho que sou uma sortuda. Deus deu-me. E continua a dar-me.
Ser mais inteligente que a maioria dos seres que me rodeia, ser mais sensível e percepcionar o que não é dito, apenas sentido... Ser mais directa, mais humana, mais qualquer coisa...

E tu? Serás alguém especial?

Acho que todas as mães acham que os seus serão sempre especiais, pelo menos para elas.
Para mim, isso será suficiente.

Serás sempre a nossa estrelinha!